Israel aposta na mistura de turismo e tecnologia para atrair mais visitantes

Há um número cada vez maior de oportunidades para os turistas que querem descobrir Tel Aviv pelo lado empreendedor. Para Yarden Leal, vice-diretora geral do Centro Peres para a Paz & a Inovação, o Centro de Inovação Israelense, inaugurado em fevereiro de 2019, transforma a ideia de uma nação de startups em “algo tangível”. A exibição interativa de hologramas, por exemplo, permite aos membros do público “conversar” com inovadores israelenses, como o inventor do USB flash drive, Dov Moran, enquanto outra exposição revela alguns produtos nacionais, que vão de veículos autônomos a um telescópio espacial. E, dentro de um túnel de realidade virtual, chamado Cápsula, é possível sentir um gostinho do futuro na tentativa de resolver alguns dos desafios globais atuais, como a escassez de alimentos, por meio da tecnologia.

Leal espera que os visitantes saiam dali entendendo que “na base do empreendedorismo está a crença de que é possível fazer a diferença”. Essa ideia ganha destaque em um documentário sobre Peres, defensor das mudanças ascendentes e do compartilhamento de conhecimento sem fronteiras, exibido em uma réplica de seu escritório. O centro também já sediou workshops empreendedores para mulheres ultraortodoxas e fechou uma parceria com o Ministério das Relações Exteriores dinamarquês e empresas palestinas para a manutenção de uma incubadora-aceleradora para companhias locais na Cisjordânia.

Outra organização que leva a energia empreendedora para além de Tel Aviv é a Start-Up Nation Central. Situada em um prédio moderno na Lilienbaum Street, perto do núcleo tecnológico do Rothschild Boulevard, a ONG coloca empresas jovens de todo o país em contato com fontes de financiamento, além de oferecer espaços de reunião e workshops profissionais. Em 2018, ela abriu o L28, restaurante com inspiração nas startups vizinhas ao estabelecimento. A cada seis meses, um novo chef-empreendedor ocupa a casa bem iluminada para fazer experimentos com a culinária local. No momento, quem comanda as panelas é a chef drusa Naifa Mulla, criando versões contemporâneas para pratos tradicionais de sua comunidade, que misturam elementos árabes e médio-orientais como o Shish Barak, uma sopa à base de iogurte e bolinhos (dumplings) de pescada – em vez das convencionais carne de boi e carneiro –, e a lula crocante.

Além disso, a nova iniciativa ACT (Arte, Culinária e Tecnologia) pretende ser o epicentro do setor de “food-tech” israelense, em franca expansão, e também um “laboratório para chefs”, ao mesmo tempo que realiza eventos que vão desde jantares pop-up até discussões com mulheres sobre agricultura e tecnologia alimentícia, segundo uma das fundadoras, Carmit Oron.

De acordo com Tova Wald, uma agente de viagens que cria itinerários personalizados para clientes de luxo corporativos e particulares a lazer, iniciativas como essas refletem o fato de que há cada vez mais viajantes interessados em vivenciar a fusão de cultura e tecnologia que existe em Israel. “De uns anos para cá, os clientes passaram a fazer questão da tecnologia como parte dos itinerários, não só em Tel Aviv, mas em outras regiões do país. Praticamente metade está a passeio, mas dizem que ouviram falar tanto das inovações que, curiosos, querem conferir pessoalmente”, explica.

Ela leva os turistas ao centro de empresas de segurança cibernética conhecido como Cyber Spark, a pouco mais de 110 quilômetros de Tel Aviv, em Beer Sheva, cidade localizada no Deserto de Negev, e organiza excursões para empreendedoras ultraortodoxas de Bnei Brak, a meia hora de Tel Aviv. Mas seus itinerários também exploram as inovações de milhares de anos em lugares como Cesareia, cidade antiga no litoral mediterrâneo, e Massada, uma fortaleza no Deserto da Judeia usada contra os Exércitos romanos em 73 d.C. “A alta tecnologia é uma ponte excelente entre os povos, as culturas e as ideias”, opina ela.

Essa possibilidade é que estimula as organizações que trabalham para expandir o setor tecnológico israelense, como a The Hybrid, que auxilia as startups de liderança árabe a crescer, e a WMN, organização de defesa e mentoria para empreendedoras em Tel Aviv e no norte de Israel. A tecnologia também se estabeleceu em Jerusalém e está crescendo em Nazaré e outros centros próximos a Tel Aviv, como Herzliya e Ra’anana-Kfar Saba.

Segundo Orlie Dahan, diretora-executiva da EcoMotion, organização que quer criar um setor de transporte inteligente em Israel, com sede em Tel Aviv, a indústria toda está escancarando suas portas. “Até pouco tempo atrás, as companhias preferiam fazer tudo sozinhas, sob sigilo; nesse mundo novo, a solução são os consórcios, com todos contribuindo com alguma coisa e, juntos, criando coisas maiores e mais excepcionais”, explica ela.

Sua sugestão aos viajantes é a inscrição em uma das “hackathons” realizadas duas vezes por ano pela EcoMotion, nas quais as equipes têm 36 horas para tentar resolver um desafio de mobilidade apresentado pelos pesos-pesados do setor, como as montadoras, ou a companhia de trens nacional francesa, a SNCF, que já convidou os participantes a personalizar o folheto de viagem que oferece aos passageiros. “Tem espaço para todo mundo. Mesmo que você não saiba codificar, pode dar uma de apresentador, gerenciar o projeto ou criar a maquete/diagrama do futuro aplicativo”, completa.

Se um hackathon parece excessivo, o que não falta são eventos menos formais noturnos ao longo do ano todo. Muitas oportunidades estão no Meetup.com, que permite ao visitante uma espiadela por trás da fachada da indústria. A Azrieli Sarona Tower, onde funcionam diversas empresas, sedia reuniões, como também o Rise Tel Aviv, um dos espaços do trabalho do banco britânico Barclays, no centro financeiro.

“É muito fácil acessar o cenário tecnológico israelense por meio de Meetups e dos eventos”, garante Erez Gavish, da TLV Starters, que serve de guia a novos empreendedores, tirando ideias do papel e transformando-as em empresas funcionais em sua sede, no Google Campus, filial israelense da cadeia internacional do Google para núcleos de startups, outro espaço para eventos tecnológicos.

A cultura coesa significa que um bate-papo pode abrir a porta e a oportunidade para outra reunião. Toda noite são realizados entre cinco e dez eventos gratuitos, quase sempre a uma curta caminhada entre um e outro, e em inglês; segundo Gavish, isso se deve ao fato de as startups nacionais geralmente precisarem de investimento de fora, usando o idioma internacional para acelerar o processo.

Para explicar a origens da inovação israelense, ele aponta uma combinação de fatores, desde profissionais com experiência militar até o ambiente desértico que inspirou métodos como a irrigação por gotejamento nos anos 60. “Por se encontrar em um local muito vulnerável, Israel precisa cultivar essa psicologia bem alinhada com a tecnologia de criação de coisas”, conclui Gavish.

O Globo