Luís Krausz analisa influência da diáspora na literatura judaica

“Entre Exílio e Redenção: Aspectos da Literatura de Imigração Judaico-Oriental” (Edusp), novo livro de Luís Krausz, professor de literatura hebraica e judaica da USP, analisa o mosaico de influências históricas e identitárias, sociais e políticas para a formação de uma literatura judaico-oriental.

O autor desvela a ramificação histórica de dois galhos fundamentais a partir do mesmo tronco judaico: “A diferenciação e a divisão dos judeus em dois grandes grupos – asquenazitas e sefarditas – surgiu, inicialmente, a partir de diferenças concernentes à lei religiosa: aquelas comunidades cuja vida religiosa se orientava de acordo com os princípios e tradições dos sábios ibéricos, estabelecidos durante a Idade Média, foram denominadas sefarditas (do hebraico, Sefarad, Espanha), enquanto as que seguiam os sábios franceses, alemães e poloneses foram chamadas asquenazitas (do hebraico, Ashkenaz, Alemanha)”.

Krausz conduz o leitor pela miríade de caminhos da diáspora para compreender como a identidade judaica vai se tornando (ainda) mais plural e contraditória do exílio à redenção, isto é, da expulsão dos judeus da península Ibérica pelas monarquias espanhola e portuguesa ao assentamento de tais comunidades no Norte da África, na Europa Meridional, no Leste Europeu e no Oriente Médio; da residência (tensa) em países muçulmanos à expulsão de comunidades judaicas antiquíssimas após a formação do Estado de Israel, em 1948.

Ele destaca que, nas sociedades muçulmanas, “os judeus, que tradicionalmente ocupavam posições secundárias em decorrência das leis religiosas do islã, desempenharam um papel importante no processo de colonização em vários países do Norte da África e do Oriente Médio, sobretudo exercendo o ofício de intermediários entre as potências coloniais e a população árabe local, seja como agentes de companhias estrangeiras, seja como funcionários dos serviços públicos implantados pelas potências coloniais”. Entre o anseio (e a ansiedade) de (não) ser europeu; entre o anseio (e a ansiedade) de, ao participar das engrenagens da colonização, (não) ser colonizado; entre a suspeição e o ressentimento dos muçulmanos em cujos países viviam, os judeus eram vistos (e se viam) como estranhos e estrangeiros, sob cujos pés ainda faltava a redenção do solo pátrio que o exílio jamais lhes pudera trazer.

É nesse contexto de exílio e ímpeto de redenção que Krausz desvela as raízes do movimento sionista: “Fundar uma identidade judaica moderna, impor uma transformação da identidade judaica e forçar o alvorecer de uma nova era na história judaica foram, desde a sua origem, os objetivos do sionismo, um movimento nacionalista que surgiu na Europa no contexto dos nacionalismos do fim do século 19 e que pregava a necessidade de mudança no estatuto social dos judeus por meio de uma recuperação dos elementos heroicos e nacionais, desprezados pelas ideias religiosas características do judaísmo diaspório. Por meio da negação da diáspora, a narrativa sionista identificava-se com a ‘geração do deserto’, os filhos da geração do Êxodo que, tendo nascido em liberdade, conquistaram a Terra Prometida e se tornaram seus redentores, enquanto que, por meio da suposição de que essa terra era uma terra vazia, a história da presença árabe nela é desconsiderada”.