Por que Israel é tão inovador?

Em termos geográficos, o país do Oriente Médio é pequeníssimo, com em torno de 10% do tamanho do estado de São Paulo e população não tão maior que a do Rio de Janeiro. Isso não impede que a nação dispute o posto de segundo maior polo de progresso tecnológico do planeta, atrás do Vale do Silício californiano, com quase seis vezes mais investimentos em startups e trinta unicórnios (as empresas novatas do setor que logo já atingiram o valor de mercado superior a 1 bilhão de dólares), frente a onze brasileiras em igual patamar. Para saber como Israel chegou lá, leia a reportagem na revista (ou na versão online).

Contudo, além dos fatores objetivos, autoridades israelenses responsáveis por promover essa faceta progressista do país gostam também de destacar que há um elemento menos tangível a contribuir com tamanho sucesso: o perfil dos cidadãos. “Sim, quando se pensam em fatores quantificáveis, colabora que somos uma nação militarizada, mantemos uma indústria ligada às pesquisas acadêmicas, a atuação do governo, a atração de fundos de investimentos”, pontuou, em conversa em Tel-Aviv, Ran Natanzon, cujo cargo soa melhor em inglês, head of innovation & country branding (algo como “líder de inovação e marca do país”) do Ministério de Relações Exteriores. Ao que acrescentou: “Mas há algo além. Nosso povo tem o perfil inovador”.

Quais seriam essas características tão propícias ao ambiente frenético, produtivo além do limite, de startups? Natanzon aponta de pronto “quais seriam” – em discurso que é repetido por empreendedores, outros representantes do governo, pesquisadores, investidores e demais das figuras associadas a essa indústria em Israel. Um dos fatores é o comportamento chamado de chutzpah. “Traduz a atitude de não ter receio de dizer o que se pensa, em opinar, em possuir audácia”, explicou.

O chutzpah conduz a outra postura comum entre israelenses: o desafio a autoridades. Apesar de ser um país militarizado – ou até por isso –, quando saem da hierarquia do Exército os cidadãos tendem a não aceitar qualquer coisa que “aqueles que mandam” falam. Isso realmente pode ser sentido nos escritórios de startups. Em diversas apresentações de CEOs e fundadores dessas empresas, às quais este colunista esteve presente, é comum observar funcionários cortando, fazendo acréscimos ou mesmo corrigindo seus chefes. E os chefes? Demonstram gostar disso.

Em combinação, o chutzpah com a atitude de não beijar a mão de qualquer um que está acima nas hierarquias, produzem um perfil ideal para se aproveitar no setor da inovação. Não por acaso essas mesmas características são exaltadas no Vale do Silício. Afinal, como progredir, como fazer diferente, se fosse o contrário? Ou seja, se em vez de se posicionarem, os funcionários simplesmente aceitassem regras e normas (muitas vezes antigas ou datadas) vindas de andares acima da firma.

“Fica também evidente em nossos cidadãos como eles apreciam se mexer, tomar iniciativas, numa `can do attitude`. Assim como não têm medo de falhas, pois sabem que errar é aprender, e só quem erra um dia pode acertar de forma maestral”, completou o head of innovation & country branding. Na visão dele, esses elementos teriam ligação com a vivência militar – obrigatória a praticamente todos os cidadãos –, assim como com o fato de Israel ser feito “uma ilha em meio ao deserto”. “Aqui é preciso pensar grande, globalmente, visto que dentro não temos um grande mercado, em quantidade de consumidores”, afirmou.

Por fim, defende-se que a diversidade da população auxilia no cenário. “Os estrangeiros acabam por se assustar com o que veem no noticiário, sem nunca ter nos visitado, procurado saber mais de Israel”, pontuou Natanzon. “Somos historicamente afeitos à diversidade. Temos pessoas de todas as etnias, religiões, pensamentos. E elas também povoam as startups”. Esse elemento aumentaria a variabilidade das empreitadas de tecnologia, assim como as deixaria mais aptas a crescerem em âmbito mundial.

Pelas ruas de Tel-Aviv, Jerusalém ou Be’er Sheva é mesmo possível atestar os elementos indicados por Natanzon – Tel-Aviv exalta diversidade, em diversos aspectos (religiosos, étnicos, sexuais, comportamentais…). Por dentro de startups, empresas firmadas, multinacionais da indústria da tecnologia, ressalta-se ainda mais essa face não tão noticiada de Israel. Mas, então, será que ainda carece algo para o mercado de inovação desse pequeno país do Oriente Médio?

“Israel tem habilidade em inovação e em desenvolver startups, e o Brasil tem habilidade em manufatura e scale-up”, comentou Alon Lavi, cônsul geral israelense em solo nacional, ao opinar sobre uma parceria firmada entre o governo brasileiro, por meio da Embrapii, com a nação do Oriente Médio. Acordo que já culminou na injeção de 7,5 milhões de dólares em startups nacionais – e promete gerar ainda mais, caso seja renovado neste ano.

Scale-up — do inglês “ampliação” — é o termo usado na área para indicar quando uma startup, em vez de ser adquirida por uma companhia maior, opta pelo crescimento por conta própria. É mesmo bem comum ouvir de empreendedores israelenses que faltaria a eles esse ímpeto pelo scale-up, tão presente, por exemplo, no Vale do Silício. Isso porque até agora o modelo mais vigente de se consolidar esses negócios por lá é fundar uma startup de sacada inovadora, para poucos anos depois vendê-la a alguma multinacional – usualmente, estadunidense –, e aí reiniciar o ciclo (com uma – ou várias – nova startup).

Algo que pode estar prestes a mudar. “Como a Startup Nation, viramos especialistas em criar negócios novíssimos para depois vendê-los. Agora é o momento de progredirmos para uma ‘Scale-up Nation’”, afirmou Udi Mokady, fundador e CEO da CyberArk, que desenvolve softwares de segurança digital para 5 mil clientes.

Fonte: Revista Veja