Psicóloga de 92 anos aplica lições que aprendeu em Auschwitz em terapias




“Você verá sua mãe em breve; ela vai apenas tomar um banho”, disse um homem de dentes separados quando sorria. Àquela altura, Edith Eva Eger, hoje com 92 anos, ainda não sabia, mas tinha diante de Josef Mengele, o oficial nazista que entraria para a história sob a alcunha de “Anjo da Morte”. Ela também não desconfiava de que ele mentira quando pediu a ela e à irmã, Magda, que fossem para uma fila de mulheres com mais de 14 anos e menos de 40, e a mãe, para outra – mas que não se preocupassem, pois logo estariam juntas de novo. Coube a uma jovem de vestido listrado esclarecer o que realmente se passava ali, apontando para a fumaça subindo de uma chaminé. “Sua mãe está queimando lá dentro. É melhor você começar a falar dela no passado”.

Assim Edith, a adolescente de 16 anos que só queria saber de dançar balé até o Exército alemão invadir seu vilarejo húngaro, foi apresentada a Auschwitz, em 1944. Descrita como a “Anne Frank que não morreu”, ela compartilhou sua história de superação no livro “A bailarina de Auschwitz” (editora Sextante).

Um dos relatos mais famosos, inclusive, a inspirou enquanto estudante de psicologia. Trata-se de “Em Busca de Sentido”, que Edith leu quase um quarto de século após o fim da Segunda Guerra Mundial e cujo autor, o psiquiatra Viktor Frankl, viraria seu mentor. “Não importa quão frustrante, chata, limitadora, dolorosa ou opressiva for nossa experiência; podemos sempre escolher como reagir”.

O que faz do livro de Edith único é a perspectiva que ela oferece não só como alguém que precisou superar os horrores do passado. Doutora em psicologia, a nonagenária ainda atende a pacientes e aplica o que aprendeu no campo de concentração em suas terapias. Edith atualmente mora na Califórnia e se diz surpresa de perceber como existe um excesso de medicação nos Estados Unidos. Para ela, é preciso “achar sua força interna” e “abraçar o possível, porque tudo pode virar uma oportunidade na vida”.

“Não tem verão sem inverno. É importante entender isso se você quer superar um trauma”, afirma ela, que pesava 32 quilos quando foi resgatada por soldados norte-americanos. Hoje ela se descreve como uma senhora ativa e ainda capaz de dar seus pulinhos de balé. Por fim, manda um recado: “O contrário da depressão é a expressão. A gente precisa se expressar, não suprimir os sentimentos”.

 

Fonte: Folha SP